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LEI 16.877/18 – Analisando

Por 21 de janeiro de 2019dezembro 3rd, 2021Sem Comentários

Atos ao cumprimento da Lei nº 16.877/18 – (Análise detalhada, feita pelo diretor da APACEJ,  Jacyloé E.G. Freire)

Em 19/12/2018 o Governador de SP promulgou a Lei º 16.877/18, decretada pela Assembleia Legislativa paulista, autorizando o Poder Executivo a extinguir o Instituto de Pagamentos Especiais de São Paulo – IPESP, dando outras providências correlatas.

Ficou definido que as Secretarias de Planejamento e Gestão e da Fazenda providenciariam, em seus respectivos âmbitos de atuação, os atos necessários ao cumprimento desta lei. Traremos, a seguir, algumas considerações relativas à Carteira das Serventias, que é de direto interesse dos associados da Apacej e demais integrantes da Carteira das Serventias.

A “Carteira de Previdência das Serventias Não Oficializadas da Justica do Estado” (hoje Carteira de Previdência das Serventias Notariais e de Registro – Carteira das Serventias), reorganizada pela Lei Estadual nº 10.393/1970, tinha a finalidade de prover aposentadoria aos serventuários, escreventes e auxiliares das serventias não oficializadas do Estado, tanto dos cartórios como dos ofícios de Justiça, assim como pensão a seus dependentes. Esses profissionais eram considerados segurados obrigatórios da Carteira. Referida lei estabelecia que a Carteira era financeiramente autônoma e dotada de patrimônio próprio. Ela contava, nos termos do artigo 43 da citada lei, com as seguintes fontes de recursos: a) contribuição mensal do segurado, em atividade ou não; b) contribuição patronal a cargo de titulares das serventias; c) parcela dos emolumentos arrecadados diretamente pelo serventuário; d) subvenção voluntária do Estado prevista no orçamento anual: e) doações e legados recebidos; f) rendimentos patrimoniais e financeiros da Carteira. Ao Instituto de Previdência Paulo do Estado de São Paulo – IPESP incumbia a administração e a representação judicial e extrajudicial da Carteira das Serventias Não Oficializadas (art. 62, caput) e pelos atos praticados pelo IPESP: na condição de gestor da Carteira, respondia exclusivamente o patrimônio desta (parágrafo único do art, 62).  Os benefícios pagos pela Carteira estavam sujeitos a regras próprias de concessão e cálculo, previstas na referida Lei Estadual nº 10.393/70. O salário mínimo foi adotado como parâmetro para cálculo e indexador dos benefícios concedidos (arts. 12 e 13).  Além disso, a lei previa acumulação dos benefícios de aposentadoria e pensão, entre si e com quaisquer outros (art. 15, caput). Vedava apenas a dupla aposentadoria, mediante contagem do mesmo tempo de serviço como segurado da Carteira e como funcionário público estadual, hipótese em que o interessado deveria optar por uma delas, de forma irretratável. A Emenda Constitucional n. 20/98 introduziu profundas alterações no sistema previdenciário, estabelecendo a divisão em três regimes específicos e distintos: regimes próprio, geral e complementar. Tendo em vista que a Carteira das Serventias não se enquadrava tecnicamente em nenhum destes regimes, foi decretado o seu regime de extinção pela Lei nº 14.016/10.

0 Partido Socialismo e Liberdade — PSOL ajuizou a ação direta de inconstitucionalidade nº 4420, face à Lei 14.016/10, perante o Supremo Tribunal Federal, cujo acórdão — já  transitado em julgado, teve a seguinte ementa:

“DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. EXTINÇÃO DA CARTEIRA DE PREVIDÊNCIA DAS SERVENTIAS NÃO OFICIALIZADAS DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. PROTEÇÃO DOS DIREITOS ADQUIRIDOS. DIREITO À CONTAGEM RECÍPROCA DO TEMPO DE SERVIÇO.

  1. A Lei nº 14.016, de 12.04.2010, do Estado de São Paulo, que declarou em regime de extinção a Carteira de Previdência das Serventias não Oficializadas da Justiça daquele Estado, não padece de inconstitucionalidade formal, visto que o constituinte conferiu aos Estados-membros competência concorrente para legislarem sobre previdência social, consoante o disposto no art. 24, XII, da Constituição Federal.
  2. A extinção da Carteira de Previdência das Serventias não Oficializadas da Justiça daquele Estado, embora possível por meio da referida lei, deve, contudo, respeitar o direito adquirido dos participantes que já faziam jus aos benefícios à época da edição da lei, bem como o ADI 4420 / SP, direito à contagem recíproca do tempo de contribuição para aposentadoria pelo Regime Geral de Previdência Social (CF, art. 201, §9º)̕ dos participantes que ainda não haviam implementado os requisitos para a fruição dos benefícios.
  3. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido se julga parcialmente procedente para: (i) declarar a inconstitucionalidade do art. 3º, caput, e § 1º, da Lei nº 14.016/2010, do Estado de São Paulo, no que excluem a assunção de responsabilidade pelo Estado; (ii) conferir interpretação conforme à Constituição ao restante do diploma impugnado, proclamando que as regras não se aplicam a quem, na data da publicação da lei, já estava em gozo de benefício ou tinha cumprido, com base no regime instituído pela Lei estadual nº 10.393/1970, os requisitos necessários à concessão; (iii) quanto aos que não implementaram todos os requisitos, conferir interpretação conforme para garantir-lhes a faculdade da contagem de tempo de contribuição para efeito de aposentadoria pelo Regime Geral da Previdência Social, nos termos do art. 201, § 9º, da Constituição Federal.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamento, sob a presidência da Ministra Cármen Lúcia, por maioria de votos, em julgar parcialmente procedente o pedido formulado para: a) declarar a inconstitucionalidade do art. 3º, cabeça, e § 1º, da Lei nº14.016/2010, do Estado de São Paulo, no que excluem a assunção de responsabilidade pelo Estado; b) conferir interpretação conforme à Constituição ao restante do diploma impugnado, proclamando que as regras não se aplicam a quem, na data da publicação da lei, já estava em gozo de benefício ou tinha cumprido, com base no regime instituído pela Lei estadual nº 10.393/1970, os requisitos necessários à concessão; c) quanto aos que não implementaram todos os requisitos, conferir interpretação conforme para garantir-lhes a faculdade da contagem de tempo de contribuição para efeito de aposentadoria pelo Regime Geral da Previdência Social, nos termos do art. 201, § 9º, da Constituição Federal, ficando o Estado responsável pelas decorrências financeiras da compensação referida, vencidos, no ponto, os Ministros Marco Aurélio (Relator), Edson Fachin e Dias Toffoli… ”

Relativamente à Carteira das Serventias, a alteração ocorrida pela Lei 16.877/18 (sob os auspícios do decidido na ADI 4420),  resumiu-se, dentre outras,  ao repasse de sua gestão à Secretaria da Fazenda, relativamente ao pagamento dos benefícios e arrecadação das contribuições. Esta alteração guarda compatibilidade com a decisão do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a responsabilidade estatal para preservação dos direitos adquiridos dos contribuintes ativos da Carteira antes da decretação do regime de extinção pela Lei no 14.016/2010.

A destinação da arrecadação das contribuições à Secretaria da Fazenda também guarda compatibilidade com a prescrição do §3, do artigo 202 da Constituição Federal, especialmente quanto à constante do inciso IV do artigo 45 da Lei no 14.016/2010.

Em trabalho anterior, fizemos alguns comentários à Lei 16.877/18, que, permitindo-nos, trazemos novamente à luz.

1)         Participantes ativos da Carteira – Requisitos para aposentadoria: Os participantes ativos da Carteira das Serventias poderão requerer aposentadoria SE  preenchidos os requisitos do artigo 20 da Lei nº 10.393, de 16 de dezembro de 1970, com alterações posteriores, i. é.:

I – idade mínima de 70 (setenta) anos e 20 (vinte) anos de contribuição para a Carteira;

II – 35 (trinta e cinco) anos, pelo menos, de efetivo exercício das funções, se homem, ou 30 (trinta) anos, se mulher, e 20 (vinte) anos de contribuição para a Carteira;

III – 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, independente da idade e do tempo de exercício de função;

IV – invalidez para o exercício da profissão

2)         Correção dos benefícios: O valor do benefício a que têm direitos os participantes da Carteira das Serventias, será reajustado anualmente de acordo com o índice de inflação calculado pelo Índice de Preços ao Consumidor – IPC, apurado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – FIPE.

Entende-se, por interpretação extensiva, que a condição então existente na Lei 14.016/2010, que “o reajuste  assim como a concessão de novos benefícios, somente será aplicado se ficar previamente demonstrada a manutenção do equilíbrio atuarial por estudo técnico, além da existência de recursos financeiros disponíveis na Carteira” não mais existe, uma vez que o artigo 12 e respectivo parágrafo, da referida lei, foram revogados;

3)         Reajuste das fontes de receita da Carteira e suspensão da aplicação de novos reajustes aos benefícios: Até a legislação anterior (Lei 14.016/2010), sob instabilidade ou insuficiência das fontes de receita da Carteira das Serventias (v.g. Lei nº 15.855/2015, que retirou 4% da receita da Carteira), o Superintendente do Ipesp estava autorizado a alterar as alíquotas de contribuição visando a manutenção do equilíbrio atuarial, sem prejuízo da suspensão imediata da aplicação de novos reajustes aos benefícios já concedidos, bem como a concessão de novos benefícios. Isso já não mais está autorizado, visto que o artigo 51 e respectivo parágrafo único, bem como o artigo 69, da Lei 10.393/70, com as alterações dadas pela Lei 14.016/2010, foram expressamente revogados.

4)         Contribuição dos participantes da Carteira das Serventias: Constituirão receitas do FECSER (Fundo Especial da Carteira das Serventias em Regime de Extinção), dentre outras, as contribuições previstas nos artigos 43 e 45 da Lei nº 10.393/1970 (com a redação dada pela Lei 14.016/2010), i.é., os participantes em atividade contribuirão mensalmente com 11% (onze por cento) sobre o total de sua remuneração; e, os participantes inativos e pensionistas também contribuirão mensalmente com 11% (onze por cento) do valor dos benefícios em manutenção. Há que relembrar o comentário do item 3, supra, que trata da impossibilidade de alteração das alíquotas de contribuição.

Ficou instituído, no âmbito da Secretaria da Fazenda, o Fundo Especial da Carteira das Serventias em Regime de Extinção – FECSER com a finalidade exclusiva de custear os pagamentos a que fazem jus os correspondentes beneficiários, na forma prevista no artigo 9º da referida lei 16.877/18; sendo que constituirão receitas do FECSER, a ele vinculadas de acordo com as necessidades financeiras correspondentes:

1 – contribuições previstas nos artigos 43 e 45 da Lei nº 10.393, de 16 de dezembro de 1970, conforme artigo 10 desta lei; (Vide comentário de nº 4, supra)

2 – contribuições fixadas na alínea “c” do inciso I, na alínea “b” do inciso II e no item 2 do parágrafo único, todos do artigo 19 da Lei nº 11.331, de 26 de dezembro de 2002, conforme artigo 11 desta lei;

3 – dotações orçamentárias próprias;

4 – quaisquer outras receitas que legalmente lhe possam ser incorporadas.

Sendo que compete à Secretaria da Fazenda a administração do Fundo Especial da Carteira das Serventias em Regime de Extinção – FECSER, assim como a fixação de suas diretrizes operacionais, devendo referido Fundo:

I – adotar escrituração própria, atendidas as normas da legislação vigente, sujeitando-se à auditoria do Tribunal de Contas do Estado;

II – movimentar os recursos financeiros que lhes sejam destinados por meio de conta especial, considerando-se, para fins de vinculação das receitas necessárias à consecução de seus objetivos, o total das despesas efetivamente empenhadas no respectivo exercício, pertencendo ao Tesouro as receitas que sobejarem às necessidades financeiras assim apuradas.

Em contrapartida à essa assunção de responsabilidades, além do direcionamento das contribuições  previstas nos artigos 43 e 45 da Lei nº 10.393, de 16 de dezembro de 1970, conforme artigo 10 da lei 16.877/18, das contribuições fixadas na alínea “c” do inciso I, na alínea “b” do inciso II e no item 2 do parágrafo único, todos do artigo 19 da Lei nº 11.331, de 26 de dezembro de 2002, conforme artigo 11 da lei 16.877/18; os bens, direitos, obrigações e demais componentes do balanço patrimonial do IPESP serão transferidos para a Secretaria da Fazenda.

E, finalmente, ficou estabelecido que as Secretarias de Planejamento e Gestão e da Fazenda providenciarão, em seus respectivos âmbitos de atuação, os atos necessários ao cumprimento desta lei.

Assim é que alguns atos já foram publicados, v.g., a Instrução GTNC 24, de 20-12-2018, que alterou a classificação institucional da Secretaria da Fazenda nos Sistemas de Administração Financeira e Orçamentária do Estado, incluindo no art. 3º da Instrução GTNC 4, o FECSER (assim como o FECARE, Fundo Especial da Carteira dos Advogados).

Recentemente (18/01/2019), mormente interesse mais à classe dos Advogados, houve publicação pela qual se verifica o andamento das providências ao cumprimento das disposições da Lei 16.877/18, i.é., o DECRETO Nº 64.073, DE 18 DE JANEIRO DE 2019, que criou o Comitê de Liquidação e estabeleceu  procedimentos para as restituições de contribuições da Lei nº 13.549, de 26 de maio de 2009, e dá providências correlatas; tendo sido, como dito, criado o Comitê de Liquidação, incumbido das ações necessárias à administração do processo de extinção do Instituto de Pagamentos Especiais de São Paulo e dos procedimentos relativos à transferência da Carteira Predial; Comitê de Liquidação esse, além de outras que lhe forem conferidas por decreto ou resolução do Secretário da Fazenda e Planejamento, tem as seguintes atribuições:

– auxiliar o Superintendente do IPESP nas atribuições de que trata o artigo 17 da Lei nº 14.016, de 12 de abril de 2010, com a colaboração dos empregados do Subquadro de Empregos Públicos em Confiança, estabelecido nas Disposições Transitórias da Lei nº 16.877, de 19 de dezembro de 2018;

– propor a realização de estudos técnicos e auditorias;

– assegurar a qualidade do atendimento aos participantes das Carteiras em liquidação;

– propor normas consideradas necessárias ao seu adequado funcionamento.

Quando faz referência ao artigo 17 da Lei 14.016/10, dispões que também competirá ao Comitê de Liquidação, auxiliar o Superintendente do Ipesp nas suas  competências, além das atribuições inerentes ao cargo e previstas em normas vigentes:

– representar a autarquia em juízo ou fora dele, ativa e passivamente;

– proceder à liquidação da Carteira de Previdência das Serventias não Oficializadas da Justiça do Estado, de que trata a Lei nº 10.393, de 16 de dezembro de 1970, com as alterações desta lei, estabelecendo a política de aplicação dos recursos financeiros existentes nessa Carteira;

– propor o encerramento das atividades do IPESP;

– outras atribuições fixadas em resolução do Secretário da Fazenda.

Há que se registrar que cabe ao Secretário da Fazenda e Planejamento do Estado a designação do coordenador e dos membros do Comitê de Liquidação, a ser constituído por servidores e empregados públicos do Estado.

Entretanto, devemos aguardar ainda mais, visto que a Secretaria da Fazenda e Planejamento poderá editar normas complementares para a fiel execução do decreto nº 64.073, de 18 de janeiro de 2019 e, a conclusão do processo de extinção do IPESP será atestada por declaração em resolução conjunta dos Secretários da Fazenda e de Planejamento e Gestão. Até lá teremos ainda outras publicações que irão regulamentar as disposições da Lei 16.877/18.