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RECURSO EXTRAORDINÁRIO NO NOSSO PROCESSO DE MÍNIMOS 06-12-2022

Por 7 de dezembro de 2022Sem Comentários

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.398.810 SÃO PAULO
RELATOR : MIN. EDSON FACHIN
RECTE.(S) : INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO – IPESP
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE SÃO PAULO
RECDO.(A/S) : ASSOCIACAO PAULISTA DOS APOSENTADOS DE CARTORIOS EXTRAJUDICIAIS
ADV.(A/S) : RINALDO PINHEIRO ARANHA

DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário interposto em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim ementado (eDOC 9, p. 2):
Apelação Cível – Ação de obrigação de fazer –
Aposentados de cartórios extrajudiciais que pretendem o reajustamento de seus proventos com base no salário mínimo, nos termos da Lei Estadual nº 10.393/70 –

Sentença de procedência – Manutenção – Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.420/SP – Regramento da Lei Estadual nº 14.016/2010 não se aplica a quem, na data da publicação da r.
Lei, já estava em gozo do benefício ou havia cumprido os requisitos necessários à sua concessão. Recurso não provido.
No recurso extraordinário, com fundamento no art. 102, III, a, do permissivo constitucional, aponta-se ofensa ao artigo 7º, IV da Constituição da República, bem como ao decidido no julgamento da ADI 4.420 e à Súmula Vinculante nº 4. Nas razões recursais, sustenta-se que (eDOC 12, p. 7):
“Os benefícios pagos pela Carteira das Serventias correspondiam a um múltiplo de salários mínimos , segundo termos dos artigos 12 e 13 da Lei Estadual nº 10.393/1970.
Ocorre que, a legislação estadual, publicada em 1970, estava incompatível com os termos do artigo 7º, inciso V, da Constituição Federal, o qual veda a vinculação do salário mínimo para todo e qualquer fim, razão pela qual não resta dúvida que os arts.12 e 13 da Lei nº 10.393/1970 não foram
recepcionados pela Constituição de 1988, cujo art. 7º veda a vinculação do salário mínimo para qualquer efeito”.

Alega-se ainda que (eDOC 12, p. 9): “Ao contrário do que constou dos fundamentos do acórdão recorrido, o cumprimento do acórdão da ADI 4420 NÃO gera dever de reajustar os futuros benefícios pelo salário mínimo. Primeiro, porque a indexação é vedada pela Constituição Federal desde 1988 e, segundo, porque a matéria do reajuste não foi objeto da ADI 4420/SP, conforme reconhecido pelo próprio Supremo Tribunal Federal (….).” A Presidência da Seção de Direito Público inadmitiu o recurso ante os óbices das súmulas 279 e 280 do STF (eDOC 15). Em 11.05.2021, a Presidência desta Corte determinou a devolução dos autos ao Tribunal de origem, à luz do Tema 25 da sistemática de repercussão geral, para observância dos procedimentos previstos nos incisos I a III do art. 1.030 do Código de Processo Civil e na alínea c do inc. V do art. 13 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (eDOC 25). Recebidos os autos na origem, a Terceira Câmara de Direito Público do TJ/SP manteve os fundamentos da decisão recorrida. O acórdão restou assim ementado (eDOC 29, p. 2): Juízo de Retratação – Ação de obrigação de fazer – Aposentados de cartórios extrajudiciais que pretendem o reajustamento de seus proventos com base no salário mínimo, nos termos da Lei Estadual nº 10.393/70 – Sentença de procedência – Manutenção – Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.420/SP – Regramento da Lei Estadual nº 14.016/2010 não se aplica a quem, na data da publicação da r. Lei, já estava em gozo do benefício ou havia cumprido os requisitos necessários à sua concessão. Manutenção do Acórdão. Em novo juízo de admissibilidade, o Tribunal a quo inadmitiu o recurso extraordinário com base no Tema 25 de RG (eDOC 31).

O IPESP interpôs agravo interno sustentado que a decisão está em desconformidade com o julgamento do referido Tema (eDOC 33). O TJ/SP admitiu o recurso extraordinário (eDOC 35). A parte recorrida juntou manifestação sustentado nulidade da decisão de admissibilidade pela ausência de intimação para apresentar contrarrazões (eDOC 38). É o relatório. Decido. A irresignação merece prosperar. Verifica-se que o Tribunal de origem, quando do julgamento da apelação, assim asseverou (eDOC 9, pp. 4-9): “A Carteira de Previdência das Serventias não Oficializadas da Justiça do Estado, entidade destinada a proporcionar aposentadoria aos seus segurados e a conceder pensão aos dependentes dos segurados, foi reorganizada em 16 de dezembro de 1970 pela Lei Estadual nº 10.393/70. A Lei nº 10.394, de 16 de dezembro de 1970, reorganizou a Carteira de Previdência dos Advogados de São Paulo, revogando a Lei nº 5.174/59. A Lei Estadual nº 13.549/09, de 26 de maio de 2009, instituiu o regime de liquidação da Carteira de Previdência dos Advogados e organizou novas regras atuariais. Por seu turno, a Lei nº 14.016, de 12 de abril de 2010, que declarou em extinção a Carteira de Previdência das Serventias não Oficializadas da Justiça do Estado, e alterou entre outras, a Lei nº 10.393/70 (…). A r. lei trouxe alterações como a proibição de novas inscrições, a possibilidade de desligamento com previsão de restituição de parte das contribuições vertidas, a instituição de novo regime de reajuste de contribuições e de benefícios, entre outras. A Autora busca a condenação da parte ré para que ela seja compelida a efetuar o reajuste dos proventos, desde maio de 2008, com base no salário-mínimo vigente, bem como a restituição dos valores equivocadamente descontados, devidamente atualizados. (…) Da leitura da legislação em comento, constata-se que, de fato, estipulou-se que o salário mínimo seria utilizado como fator de indexação dos proventos de pensão e aposentadoria dos serventuários vinculados à carteira de previdência mantida pelo IPESP. No caso em tela não se está a discutir a manutenção deste ou daquele regime jurídico. Entendo tratar-se sim de respeito ao contrato (de previdência) e obrigações assumidas, cujas regras devem ser integralmente cumpridas tal como firmados. O contrato foi celebrado por livre iniciativa das partes, cumprindo-lhes honrarem todo o pacto estabelecido. O aplicável para a aposentadoria é aquele em que o peticionário preencheu os requisitos legais para tanto, ainda que não tenha exercido a faculdade que lhe assistia. A alteração posterior não pode atingir direito por ele adquirido quando da plena vigência da lei anterior. Àquele que na data da publicação da Lei, já estava em gozo de benefício ou já tinha cumprido, com base no instituído pela Lei nº 10.394, de 1970, os requisitos necessários à concessão do benefício, são inaplicáveis as regras instituídas pela nova norma, nos termos do decidido pelo C. STF na ADI 4429/SP. (…) Nessas circunstâncias, o reajuste dos benefícios com base no salário mínimo regional, nos termos previstos na Lei nº 10.393/70, não afronta o disposto na Súmula Vinculante n.º 4, do STF, posto que garante a segurança jurídica e visa tão somente o estrito cumprimento de dispositivo legal, que não pode ser alterado por decisão judicial.

Nesse cenário, a discussão acerca da não recepção pela Constituição Federal do salário mínimo como indexador restou dirimida para aqueles que já haviam firmado o contrato de previdência, quando do advento da nova lei. Não se desconhece que o artigo 7º, inciso IV, da CF passou a proibir expressamente a vinculação do salário mínimo para qualquer fim. Ocorre que a ADI 4420 foi julgada em 16/11/2016, mais de 8 anos depois de editada a Súmula Vinculante nº 4 e evidentemente depois da CF/88, de modo que o STF, ao dar interpretação conforme à constituição determinando que as regras da Lei Estadual nº 14.016/10 não se aplicam a quem já gozava o benefício, acabou por recepcionar totalmente a Lei nº 10.393/70.” (grifos nossos) Observa-se que o entendimento adotado no acórdão recorrido diverge da jurisprudência firmada neste Supremo Tribunal Federal, no sentido de reconhecer a possibilidade da indexação de benefício pago a servidor pelo salário mínimo. Nesse sentido: “AGRAVO INTERNO EM RECLAMAÇÃO. ADI 4.420. APOSENTADORIA CONCEDIDA COM PROVENTOS EQUIVALENTES A 11,05 SALÁRIOS MÍNIMOS. REGIME JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO PREVISTO NA LEI 10.393/70. CARTEIRA DE PREVIDÊNCIA DAS SERVENTIAS NÃO OFICIALIZADAS DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO EXTINTA PELA LEI 14.016/2010. FORMA DE REAJUSTE DA APOSENTADORIA. SALÁRIO MÍNIMO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PRETENSÃO DE MANUTENÇÃO DA ALÍQUOTA DE 5%. DIFERENÇAS. AUSÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO A REGIME JURÍDICO. PRECEDENTES. RESSALVA DO ENTENDIMENTO DA RELATORA. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Ausente a identidade material entre o paradigma invocado e o ato judicial impugnado, não se cogita afronta à ADI 4.420. 2. Agravo interno conhecido e não provido, com aplicação da penalidade prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, calculada à razão de 1% (um por cento) sobre o valor arbitrado à causa, se unânime a votação.” (Rcl 43.321-AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 26.4.2021). “AGRAVO INTERNO NA RECLAMAÇÃO. CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO. DIREITO ADQUIRIDO. NULIDADE DA DECISÃO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. SUPERAÇÃO. ALEGADA VIOLAÇÃO À DECISÃO DO PLENÁRIO DO STF NA ADI 4.420/SP. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE TERATOLOGIA. ACÓRDÃO PARADIGMA QUE NÃO AFIRMOU O DIREITO DO RECLAMANTE A MANUTENÇÃO DE REGIME JURÍDICO. DECISÃO RECLAMADA CONSENTÂNEA À JURISPRUDÊNCIA DESTE STF E À SÚMULA VINCULANTE 4. AGRAVO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. 1. A ausência de citação da parte beneficiária impede a declaração de procedência da reclamação, por ofensa à garantia constitucional do contraditório (artigo 5º, LV) e à regra do artigo 9º do CPC. A nulidade em questão é passível de superação, haja vista a manifesta improcedência da reclamação. 2. A reclamação, por expressa determinação constitucional, destina-se a preservar a competência desta Suprema Corte e garantir a autoridade de suas decisões, ex vi do artigo 102, inciso I, alínea l, além de salvaguardar o estrito cumprimento das súmulas vinculantes, nos termos do artigo 103-A, § 3º, da Constituição da República, incluído pela Emenda Constitucional 45/2004. Trata-se de instrumento processual de natureza eminentemente excepcional, sob pena de subversão de toda a lógica do encadeamento processual e de uma excessiva avocação de competências de outros Tribunais pela Suprema Corte. 3. Forte na excepcionalidade da via processual da reclamação, a jurisprudência desta Corte tem assentado como requisito de seu cabimento a demonstração da teratologia da decisão reclamada. Precedentes: Rcl 28.338-AgR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Primeira Turma, DJe de 14/11/2017; Rcl 23.923-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe de 9/11/2016). Consectariamente, se a decisão reclamada tiver dado interpretação razoável a precedente vinculante do Supremo Tribunal Federal, não se mostrará cabível a revisão da decisão judicial em sede de reclamação, sob pena de desvirtuamento de todo o sistema recursal. 4. In casu, o acórdão invocado como paradigma (ADI 4.420/SP, Rel. p/ o acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 16/11/2016) não veiculou entendimento de que a preservação do direito adquirido garantiria ao requerente e seus pares a manutenção da indexação de seu benefício ao salário mínimo e o congelamento ad aeternum da alíquota de suas contribuições previdenciárias. A rigor, o Eminente Ministro Redator para o acórdão ressalvou expressamente a inexistência de direito adquirido nestas matérias. 5. Ademais, a decisão reclamada é consentânea aos entendimentos assentados por esta Corte, no sentido de que não há direito adquirido a regime jurídico tributário (ADI 3.128/DF, Red. p/ o acórdão Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, julgado em 18/8/2004) e no sentido da inconstitucionalidade da indexação de benefício pago a servidor pelo salário mínimo (Súmula Vinculante 4). 6. Agravo a que se dá provimento, para reformar a decisão agravada e julgar improcedente a reclamação.” (Rcl 37.892- AgR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Rel. p/ acórdão, Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 10.11.2020). (grifo nosso). Cito ainda precedentes os seguintes precedentes: ARE 1.390.039, Rel. Min. Rosa Weber; ARE 1.390.043, Rel. Min. Dias Toffoli; e Rcl 42.874, Rel. Min. Gilmar Mendes. De outra parte, embora não deva prevalecer o salário mínimo como índice de reajuste disposto na Lei Estadual nº 10.393/70, deve ser mantido o valor nominal dos benefícios em seu valor original. É que, apesar de a lei que conferiu a correção aos proventos está em dissonância com o entendimento desta Corte, a quantia originalmente definida deve ser mantida, pois não foi afetada pelo ato normativo que conferiu o reajustamento. Assim, deve ser observado o valor estabelecido antes da entrada em vigor da Lei n° 10.393/70. De último, com relação à petição da parte recorrida sustentando nulidade do julgamento do agravo interno (eDOC 35 e DCO 38), verifico que não assiste razão à recorrida. Com efeito, a decisão que admitiu o recurso não analisou o mérito da demanda, não havendo que se falar em nulidade por cerceamento de defesa. Ante exposto, dou provimento parcial ao recurso extraordinário para afastar o reajuste do benefício previdenciário vinculado à variação do salário mínimo regional, nos termos do art. 932, V, b, do CPC, mas reafirmo a necessária manutenção do valor nominal fixado antes da Lei n° 10.393/70.

Publique-se.

Brasília, 06 de dezembro de 2022.

Ministro EDSON FACHIN

Relator Documento Assinado Digitalmente

 

 

 

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